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Caítulos de 8 e 9 "A Regressão"

Capítulo VIII



A Regressão III


        Deite-se no divã, Daniel. – Diz o hipnotizador.
Daniel deita-se e começa a desligar-se dos problemas terrenos. Ao som da voz do hipnotizador, ele deixa-se levar para uma outra esfera.
        Neste momento, você estará desligando-se de sua pequena vida material, para entrar em seu subconsciente. Você encontra-se em um mar de luz. Agora, todas as suas preces foram atendidas. Imagine uma bola de luz vindo em sua direção. Ela quase ofusca sua visão, mas ela é o norte de sua bússola. Neste momento, você sente que pode até tocá-la. Você apenas a observa imóvel. A cada respirada você se sente mais relaxado. Uma imensa paz passa pela sua cabeça, que assiste à bola luminosa. Há uma mistura de relaxamento, prazer e êxtase. Agora, quando eu contar de dez a um, regressivamente, você irá tentar tocar esta bola. Mas, somente quando eu chegar ao “um”, você conseguirá tocá-la e, com isso, entrará num estado de suprema tranqüilidade. E, assim, irá se sentir livre e seguro na luz que lhe rodeia. Dez. Nove. Oito. Sete. Seis. Minha voz está muito distante agora, mas estarei aqui o tempo todo em que precisar de mim. Cinco. Quatro. Três. Dois. Lembre-se de que, se em algum momento qualquer você sentir medo e não quiser mais ver o que sua mente tem a mostrar, tudo que tem a fazer é abrir os seus olhos. Um.


A Transição III

Estou agora naquele estado de segurança oferecido pela luz. Uma imensa satisfação me invade a alma. É como a certeza de que descobrirei o meu velho mundo e destrancarei o meu novo.
Os mosaicos coloridos tomam conta da cena. Uma leve névoa vem ao meu encontro.
Agora, uma sensação angustiante invade o meu peito e, um nó na garganta se forma. No meio da névoa surge uma criança, que vem ao meu encontro. Deve ter entre oito e dez anos... O garoto parece estar com um olhar de choro, pois traz os olhos vermelhos e envergonhados. O porquê, eu não sei. Ele se aproxima e diz:
        Você tem certeza de que está preparado para ver o que sua memória tem para mostrar?
        Acho que sim. Afinal, eu acho que já vi tudo de mais aterrorizante que podia ver. – Diz Daniel, certo de que nada mais irá chocá-lo.
        Pode ter certeza de que você ainda não viu nada que prejudicasse sua vida atual. Tudo o que você verá a partir de agora, irá mexer com os seus princípios, sua conduta e poderá trazer danos irreversíveis à sua memória. – Explica o garoto.
        Tudo bem. Mas, eu já cheguei até aqui... Não vou recuar agora. Seja lá o que for, eu quero ver. – Diz Daniel, convicto de seu desfio.
        Então, está bem. Você verá tudo o que tem para ver sobre o seu passado, meu irmão.
O menino sorri, sarcasticamente,  vai embora e, eu fico sem reação. Não sei nem o que pensar direito. Aquele sorriso me intriga.


A Revelação

As luzes se dissipam, a névoa vai embora e, somente o breu é meu companheiro agora. Parece que mais uma porta de minha memória vai se abrir neste momento. Não consigo compreender o que aquele garoto quis dizer com tais palavras. Não sei nem se ele fez parte do meu passado.
Vejo, agora, ao longe, uma nova cena de minha memória. Mais uma vez, as cenas começam a se repetir para que eu compreenda um pouco mais de minha, ainda obscura, vida. A cena, agora, começa a ficar mais clara, mais perto e nítida. Vejo aquele homem que havia visto em algumas cenas de minha memória; o mesmo homem que parecia ser o arquiteto daquela obra e patrão de Jean. Ainda não posso ouvir o que estão conversando, mas o arquiteto parece estar chamando a atenção de Jean. Este arquiteto, eu vi no quarto de Glória. Acho que começo a entender o que está acontecendo. O arquiteto, provavelmente, é o marido de Glória e, Jean era o seu amante. Interessante... Mas, o que seria tão pavoroso que eu não iria querer ver? Me aproximo dos dois para poder entender o que conversam. As vozes começam a fazer um maior sentido agora. O homem está com o dedo indicador em riste no rosto de Jean. A discussão parece ser grave. Chego, ainda mais perto, para saber do que o assunto trata. Agora, já posso ouvir a discussão.
        Olha aqui, Jean! Eu não sou nenhum palhaço para esperar pela tua boa vontade...
        Mas, Bernardi, eu não posso fazer nada. Tu diminuíste o número de empregados. E, além di...
        O número de empregados contratados é problema meu. O teu é entregar esta obra dentro do prazo previsto.
        Mas, com a redução de efetivo, é lógico que o trabalho vai reduzir o ritmo...
        Não tem mas, nem meio mas. O problema não é a redução de peões, o problema é que tu és muito mole com esses arigós. Tu tens que mostrar quem manda, senão, essas mulas não trabalham. Eu te juro, Jean, que se não fosse o último desejo de nosso pai te ver trabalhando nesta empresa, eu já teria te mandado procurar emprego no raio que o parta. Eu só aturo a tua frouxura pela memória de nosso pai...
Meu Deus, ele é meu irmão! Eu era apaixonado pela mulher do meu próprio sangue! O que eu fiz, Cristo? Socorro! Eu traí o meu próprio irmão! Alguém me ajude! Alguém me tire daqui! Calma... Deve haver algum motivo para isto ter acontecido. Meu Deus! Eu me sinto rastejando... Eu quero abrir os olhos, mas não consigo. Eu não quero ver mais nada. Eu quero sair daqui! Deus me ajude!
Sinto que estou conseguindo abrir os olhos e retornar à superfície. Consegui abrir os olhos...


Capítulo IX



O Retorno III


Daniel retorna da regressão ofegante, desnorteado e em total estado de choque. O hipnotizador, vendo o estado de Daniel, diz:
        Como você está se sentindo, Daniel?
Daniel não consegue responder. Ele abre e fecha as mãos constantemente. Parece querer que o sangue circule melhor.
        Deite-se novamente, Daniel. Respire e tente esquecer por um momento o que viu. – Diz o hipnotizador.
        Eu não quero ver mais nada. – Diz Daniel.
        Acalme-se. Pelo que entendi, teremos de fazer mais uma sessão de regressão para encerrarmos a terapia. – Afirma o hipnotizador.
        Como assim? Eu já vi tudo que tinha para ver. – Diz Daniel, irritado.
        Eu escutei e gravei tudo o que disse em todas as sessões de regressão e, sinceramente, eu ainda não tenho certeza de nada que aconteceu em sua última encarnação. Acho que tem de ser feita uma última regressão para que vejamos todas as cenas do princípio ao fim. – Explica o hipnotizador.
        Mas, eu ainda não vi tudo, do princípio ao fim? – Questiona Daniel.
        Talvez sim. Mas, as cenas de sua memória estão todas misturadas. Eu escutei diversas vezes as fitas de suas consultas e tudo que você contou até agora dá, no mínimo, dois sentidos para sua história. E como você interrompeu a última regressão, talvez você tenha perdido a conclusão de tudo. – Explica o hipnotizador.
        Não. Eu não posso continuar com isso. – Insiste Daniel.
        Pense bem. É a sua última chance de terminar com os seus pesadelos. Se você não tiver certeza de tudo o que aconteceu, você não está curado. Entendeu Daniel? – Apela o hipnotizador.
        Eu não sei. Eu vou ter de pensar a respeito.
        Daniel, pense bem. Esta será a sua última regressão. Se você for até o final, você destrancará o passado e viverá o seu presente sem medo. – Insiste o hipnotizador.
        Eu quero pensar melhor sobre tudo.
        Daniel, nesta última regressão, eu garanto que você verá tudo com clareza. O seu cérebro colocará o filme todo em ordem seqüencial e, assim, nós realmente entenderemos o que aconteceu com você e desobstruiremos o seu passado. Pense! – Conclui o hipnotizador.
        Realmente, eu preciso de um tempo para pensar. – Diz Daniel, ainda traumatizado pelo o que viu em sua regressão.
        Tá o.k., Daniel. Se mudar de idéia, é só ligar e marcar uma última consulta. Tenho certeza de que você vai querer fazer uma última regressão. – Diz, com otimismo, o hipnotizador.


De Volta para Casa

Daniel sai do consultório com um arrependimento em seu semblante. Ele acredita em tudo o que viu, mas não aceita. No rádio, uma música de Steve Vai, chamada Tender Surrender. Ele parece estar “viajando” com a bela música. A música instrumental o faz lembrar de cada momento que passara em suas experiências de regressões. Agora, ele já não está tão chocado com as cenas de sua memória e, pensa nos momentos felizes que vira também, lembrando, através de suas visões, os momentos felizes que vivera com Glória. Mas, hoje, ele tem uma nova vida com outra mulher e um filho. Não pode mais ficar vivendo no passado. Ele decide esquecer todo o passado, com a esperança de não ter mais os seus pesadelos.
Daniel chega em casa, calmo, relaxado e pensativo. Não parece ser o mesmo Daniel de outrora.
Natasha se encontra na sala de estar, assistindo à televisão. Daniel entra em casa e, Natasha vai até a porta para recebê-lo. Natasha observa o seu semblante calmo, como já não via há muito tempo e, diz:
        Dani, como foi a terapia? Já chegou ao fim?
        É, mais ou menos. – Diz Daniel, beijando-a.
Daniel caminha em direção ao sofá para sentar-se e relaxar. Natasha senta-se ao seu lado e diz:
        Você não viu tudo ainda?
        Eu acho que já vi tudo, mas o hipnotizador disse que está tudo com duplo sentido. Não é possível ter certeza de nada ainda.
        E quantas sessões serão necessárias para concluir a regressão? – Pergunta Natasha, curiosa.
        O hipnotizador disse que há a necessidade de mais uma sessão de hipnotismo.
        Mas, você já fez algumas sessões. O normal não é fazer apenas uma?
        Não sei. Talvez a minha última existência tenha sido muito tumultuada e, meu subconsciente está todo fora de ordem. Acho que é por isso que eu tenho de fazer tantas sessões.
        Sei. Por estar tudo embaralhado na sua memória subconsciente, tem de se fazer várias sessões para juntar tudo como num quebra-cabeça. – Conclui Natasha.
        Exatamente! – Confirma Daniel.


Na Cama

Daniel e Natasha estão deitados na cama, discutindo sobre a última regressão de Daniel e decidindo se ele deve fazer mais uma sessão de regressão de memória; quando Natasha resolve falar sobre outro fato em sua vida atual.
        Dani! A gente nunca mais saiu. Eu queria sair para algum lugar.
        Ah, não sei... Eu não gosto mais daquelas festas tumultuadas... – Diz Daniel, que é interrompido por Natasha.
        Não. Eu não estou falando de festas tumultuadas. A gente não sai para lugar algum. É só de casa para o trabalho, do trabalho para casa.
        Tá, mas aonde poderíamos ir?
        Ai, Daniel! Tem tantas opções nesta cidade, pelo amor de Deus! Só não sai quem não quer.
        Tá, mas me dá uma sugestão.
        Ah, podemos ir ao teatro, ao museu, à ópera... São tantas opções! Diz Natasha, tentando persuadi-lo.
        Tá, eu posso escolher?
        Pode. Nós saindo é a conta.
        O que você acha de nós irmos ao cinema?
        Ai, Daniel! Que falta de criatividade! Vamos ir a um lugar para fazer a mesma coisa que fazemos em casa: assistir filmes. Por favor, Daniel! – Diz Natasha rejeitando a sugestão de Daniel.
         Então, dê uma sugestão você!
         Que tal uma ópera? – Sugere Natasha.
         É, uma ópera seria interessante... Mas, tem que ser ópera com teatro.
         Certo! Então, amanhã eu vejo no jornal as óperas que estão em cartaz nos teatros. – Diz Natasha empolgada.


A Ópera

Daniel está em seu escritório, quando lembra de seu compromisso com Natasha. Então, ele pega o telefone e liga para casa. O telefone toca em sua casa e, Natasha o atende.
        Alô!
        Oi! Sou eu, Daniel.
        Ah, oi! Você comprou as entradas para a ópera de hoje à noite?
        Pois é, eu não tive tempo de sair do escritório hoje. – Justifica Daniel.
        Ah, Daniel! Por que você não mandou algum funcionário comprar as entradas?
        Eu nem me lembrei...
        Eu sei bem do que você esqueceu: de mim! – Interrompe Natasha.
        Natasha, não faça drama.
        Não é drama, Daniel. É que a gente nunca sai e, quando eu penso que vou sair da rotina, você simplesmente esquece que tinha marcado de sair comigo. Pôxa, Dani!
        Deixe de ser chorona! Eu comprei as entradas para a ópera! Eu só estava brincando!
        Ah! Vindo de você eu imaginava que você havia esquecido mesmo. Você nunca lembra dos seus compromissos comigo. – Explica Natasha.
        É, mas eu lembrei, sim.
        Qual é a ópera que iremos assistir? – Pergunta Natasha.
        Eu comprei as entradas para Carmen, de Bizet.
        Ah, essa é ótima! Eu só vi pela televisão, nunca ao vivo.
        É, hoje nós vamos ver ao vivo, tá bom?
        Tá.
        Então, eu vou desligar, que tenho algumas coisas para fazer e, daqui a pouco, eu estarei em casa.
        Tá bom. Então, tchau!
        Tchau! – diz Daniel, que desliga o telefone.
Algumas horas depois, Daniel chega em casa. Natasha já o esperava pronta. Natasha está usando um vestido longo preto e, usa uma maquiagem leve, ressaltando a beleza de seu rosto. Daniel a vê e fica espantado com sua beleza, que não via há tempos. Daniel a beija e diz:
        Como você está linda hoje!
        Daniel, eu já lhe disse que a pior coisa que uma mulher pode ouvir é: “como você está linda hoje”. Isso quer dizer que ela não é bonita e, sim, que a produção a deixou bonita.
        Só quis fazer um elogio. Mas, já que você não aceita, eu não elogio mais.
        Não é que eu não goste de um elogio; é que você não sabe elogiar. – Brinca Natasha.
        Tá bom! Chega de “papo furado”. Deixe eu ir me vestir. No mínimo, eu tenho que estar à altura desta sua “mega-produção”.
Daniel veste-se em um black-tie que comprara em um shopping perto de seu escritório. Natasha, vendo a nova roupa, o elogia, dizendo:
        Como você está bonito hoje!
        Tá bom. Vai tirar sarro só porque eu cometi uma gafe?
A televisão está ligada no quarto, onde Daniel veste-se, quando começa o noticiário, relatando mais um assassinato.
        Mais um assassinato misterioso! Foi assassinado mais um casal de mesma faixa etária dos anteriores. Como os outros, este casal foi assassinado com duas facadas nas costas e um corte na jugular. Foram feitas extrações dos testículos e ovários. E, mais uma vez, fora encontrado, junto às vítimas, um CD da banda, ainda desconhecida, mas com 8 milhões de cópias vendidas, Tragedy. A polícia  investiga o porquê de tais mortes serem tão peculiares. Mas, ainda não chegaram a nenhuma conclusão. Mais notícias, em breve, no JB Notícias.
Daniel comenta com Natasha sobre a notícia recém vista.
        Que coisa horrível!
        É, não se tem mais segurança em lugar nenhum. – Comenta Natasha.
        A gente paga uma porrada de impostos para quê? Pagamos por segurança, mas os bandidos estão melhor armados do que a polícia. Falam em desarmamento, mas os bandidos usam armamento pesado do exército. Pelo amor de Deus! Onde este país vai parar? – Pergunta Daniel, já sabendo a resposta.
        É, eu não sei o que as autoridades desse país esperam para tomar uma atitude mais drástica. – Completa Natasha.
        Não, o pior é que estamos entrando num colapso e os políticos não enxergam isso. Estamos à beira de uma guerra civil e ninguém faz nada. Há um excesso de direitos humanos neste país. Direitos humanos são para o trabalhador, que paga os seus impostos. Não para vagabundos, assassinos, ladrões, tarados, etc. O problema deste país é a inversão de valores. Vagabundos, assassinos e ladrões vão na televisão e dizem que o que eles fazem é “crime-arte”. Dizem que o que falta para o país é justamente o tal “crime-arte”. E o povo, como é ignorante, acredita nisso e transforma bandidos em ídolos. Meu Deus! Onde tudo isso vai parar? – Discursa Daniel.
        Dani, agora esquece isso. Hoje, nós temos uma noite de verdadeira arte. “Ópera in the night”. – Diz Natasha, sedutora.
Daniel, então, a beija e desliga a televisão.


A Tragédia

Daniel e Natasha estão nos lugares mais caros do teatro. Antes de começar o espetáculo, Daniel lembra-se de desligar o seu celular e pede para que Natasha faça o mesmo.
É anunciado o início do primeiro ato. A iluminação está perfeita, o cenário está deslumbrante e o figurino parece ter sido feito por Armani.
Daniel está “bobo”, pois há anos não assistia a uma ópera. Já havia esquecido a magia do teatro. A peça transcorre em perfeita harmonia. Tudo parece perfeito.
O segundo ato começa. Carmen entra em cena, belíssima. Seu canto lírico parece ensurdecer, tão alto é o tom que ela atinge.
Entra em cena um novo personagem. Tão novo, que chega a intrigar Daniel. O novo personagem veste uma roupa de couro preta, capuz e uma arma Magnum, calibre 45. Daniel tenta entender o que está acontecendo, mas é impossível. Ele tenta achar uma lógica para aquele tão inusitado personagem, mas não acha nenhuma explicação.
O personagem mascarado fala com Carmen, de forma não-lírica.
        Eu odeio esta peça! – Dito isso, ele aponta sua arma para Carmen.
Ela não diz nada e, permanece imóvel, totalmente sem reação. O mascarado, então, insiste:
        Eu odeio esta peça! Eu odeio esse filho da puta, chamado Bizet! E odeio qualquer uma que se chame Carmen. – Diz o mascarado, com a arma apontada para o rosto da atriz.
        Meu nome não é Carmen. Meu nome é Lígia. Carmen é só uma personagem... – Tenta defender-se a atriz, até ser interrompida pelo mascarado.
        Cala a boca, vadia! Você está tentando me iludir. Mas, você não me engana mais, Carmen. Eu te amei e você me enganou... Você me traiu. Vadia! – Esbraveja, com a arma trêmula, o homem mascarado.
        Eu não sou Carmen! – Diz a atriz, chorando desesperada.
Daniel olha em sua volta e percebe que, as pessoas da platéia não estão chocadas com o estranho homem. Daniel mantém-se calmo exteriormente. Pensa que, talvez, ele não tenha lido a sinopse do texto com atenção. Talvez seja uma versão de um diretor meio louco.
O mascarado continua, no palco, ameaçando a atriz, dizendo:
        Eu escrevi cartas, mandei flores, te dei perfumes, te mandei jóias; tudo para tentar te reconquistar, mas você nunca me respondeu... – Diz o mascarado, até ser interrompido pela atriz.
        Eu já disse que eu não sou Carmen! Eu nunca te vi antes... – Tenta explicar a atriz, mas o mascarado a interrompe:
        Mas, os presentes você aceitou, sua puta!
        Como eu iria devolver os presentes? Eu nunca vi você antes!
        Agora, você não lembra de mim! Você é igual a todas as vadias que conheci. Como eu fui acreditar em você? Como? – Pergunta o mascarado, entre gritos e berros.
Daniel, neste momento, começa a externar o seu pânico. Ele olha para o lado e Natasha já não se encontra mais ali. O pânico de Daniel aumenta e, ele não sabe mais o que fazer. Enquanto isso, no palco, continua a discussão entre a atriz e o mascarado.
        Não me mate, por favor! Não me mate! – Suplica a atriz.
        Deus é testemunha de que eu tentei evitar esse trágico desfecho, meu amor! – Explica o mascarado.
        Por favor! – Diz a atriz em prantos.
        Desculpe, minha querida Carmen.
O mascarado termina o seu discurso de amor e puxa o gatilho da arma, assassinando a atriz à queima-roupa. Daniel não consegue conter-se e grita:
        Pelo amor de Deus! Esta peça não tem essa palhaçada!
O assassino olha para Daniel e diz:
        Sente-se de volta em seu lugar, Daniel.
        Como você sabe o meu nome? – Pergunta Daniel apavorado.
        Está com medo, Daniel? – Pergunta o assassino com um sorriso sarcástico.
        Quem é você?
        Eu sou o seu passado vindo lhe cobrar, Daniel.
        Não! – Grita Daniel.
O assassino mascarado aponta a Magnum 45 para Daniel e diz:
        Abra os olhos, Daniel!
Dizendo isso, ele atira contra Daniel.
Daniel é assassinado em meio ao espetáculo de teatro. Ninguém toma atitude alguma, pois todos parecem acreditar que toda aquela cena pertence ao espetáculo.
Daniel encontra-se fora do corpo. Ele olha para o lado e vê Glória sentada no lugar de Natasha. Ela olha para Daniel e diz:
        Eu vim buscá-lo, meu amor.
        Eu estou morto de verdade? – Questiona Daniel.
        Sim, meu amor. – Responde a doce Glória.
        Quem é esse homem que me matou? – Pergunta Daniel desesperado.
        Por que você não pergunta diretamente a mim, Daniel? – Diz Glória, com a voz do assassino mascarado. Daniel, em pânico, grita:
        Nãããão!
Daniel acorda em meio ao espetáculo, que estava assistindo antes de pegar no sono. Todos olham para Daniel com um olhar de desaprovação. Os atores, entretanto, não se intimidam e continuam o espetáculo, como se nada estivesse acontecendo. Natasha, envergonhada, diz a Daniel:
        Pelo amor de Deus! O que deu em você, Daniel? – Pergunta Natasha em voz baixa.
        Eu acho que eu adormeci e tive um pesadelo. – Explica Daniel em mesmo tom.
O monitor aproxima-se de onde Daniel e Natasha estão sentados e diz:
        Por gentileza, vocês poderiam assistir ao espetáculo em silêncio? Senão, serei obrigado a convidá-los a se retirarem do teatro. – Explica o monitor.
        Sim, senhor. A gente vai ficar em silêncio. – Garante Natasha.
Eles assistem ao espetáculo até o fim. Daniel se controla para não dormir e causar mais um vexame.


De volta à casa

Natasha, indignada com o que houve no teatro, tenta pedir uma explicação a Daniel:
        Daniel, o que houve no teatro hoje?
        Eu tive outro de meus pesadelos. – Justifica Daniel.
        Quando isso vai acabar, Cristo!
        Eu acho que vou ter de fazer a última regressão de memória para me livrar desse “karma”. – Conclui Daniel.
        É o que eu estava pensando agora. Se é para você se livrar desses pesadelos, que já estão interferindo em nossas vidas, então faça essa droga de regressão. – Diz Natasha, decidida.
        Eu vou ligar para o hipnotizador e marcar essa regressão. – Decide Daniel.